SOBRE DEUS E O PEIXE-VOADOR

"DEUS E O PEIXE-VOADOR", de Douglas Oliveira (Editora Folheando, Belém: 2018) é uma composição de seis contos, todos autônomos, embora interligados pela atmosfera fantástica, pela recorrência de alguns personagens, pela presença do humor, mas também pela crítica sutil, embora vigorosa, dirigida a certo imaginário religioso, seus mitos, suas práticas nefastas, seus preconceitos e exclusões. Nesse sentido, o leitor mais ortodoxo, assim como ocorre a alguns dos personagens com esse perfil, pode tanto surpreender-se quanto estranhar certas revelações e mesmo certas composições. A propósito de composições, e aqui evoco outra ortodoxia, a do leitor esteticamente mais crítico, não há de passar despercebida alguma superficialidade na representação de certas cenas e diálogos quando o contexto parece exigir o oposto, elemento, entretanto, perdoável, algumas vezes, dado o tom satírico do conjunto. A própria narrativa, aliás, enquanto execução técnica, não está isenta desse tom de estranheza, ou melhor, de incômodo, dadas circunstanciais formalidades do narrador, o que não quer dizer que certas cenas e falas de personagens não a exijam. Outrossim - e isto não deixa de se relacionar com aquela formalidade, embora não seja o único responsável por ela - há um excesso, e consequentes inadequações, de verbos no pretérito mais-que-perfeito. Nada disso, porém, chega a comprometer o mérito literário, criativo, figurativo, de Douglas Oliveira, aliás, alicerçado em admirável erudição - que a imaginação submete a seu bel-prazer! Não compromete, sobretudo, a crítica cultural que anima a obra, crítica importante e à qual, como se o outro lado da moeda, se conecta um não menos vigoroso apelo ao respeito das diferenças, que, como sabemos, inscrevem o humano.